sábado, 2 de janeiro de 2016

Mediação, Conciliação e Arbitragem.

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A MEDIAÇÃO

A mediação é de origem antiga. Mediar significa literalmente dividir ao meio, advém do latim "mediare". Como já fora dito, a mediação é uma forma de autocomposição, pois uma ou ambas as partes devem abrir mão de parcela ou da totalidade de seu interesse a fim de solucionar o litígio, que deve ser conduzido por um terceiro que detenha neutralidade em relação aos demandantes. Salienta-se que esse terceiro não decide, nem impõe decisão alguma, mas ajuda as pessoas envolvidas na querela a chegarem a um ponto comum, em que seja possível a solução da controvérsia sem necessidade de acionamento do Estado-Juiz.

Nesse mesmo sentido, Rodrigues Júnior aduz o que se segue:

A mediação é um processo informal de resolução de conflitos, em que um terceiro, imparcial e neutro, sem o poder de decisão, assiste às partes, para que a comunicação seja estabelecida e os interesses preservados, visando ao estabelecimento de um acordo. Na verdade, na mediação, as partes são guiadas por um terceiro (mediador) que não influenciará no resultado final. O mediador, sem decidir ou influenciar na decisão das partes, ajuda nas questões essenciais que devem ser resolvidas durante o processo. (RODRIGUES JÚNIOR, 2007, p. 50).

O autor Juan Carlos Vezzulla a define como:

Técnica de resolução de conflitos não adversarial, que, sem imposições de sentenças ou de laudos e com um profissional devidamente formado, auxilia as partes a acharem seus verdadeiros interesses e a preservá-los num acordo criativo em que as duas partes ganhem. (VEZZULLA, 1998, p. 16).

Decerto, pelos ensinamentos acostados, verifica-se que a mediação não tem forma rígida, é um procedimento informal. Outrossim, as partes envolvidas na sessão de mediação devem ser capazes, nos termos do Código Civil vigente, sendo que os interesses em jogo devem ser os chamados interesses disponíveis. Ainda, a ata de mediação pode ser verbal, mas recomenda-se que seja escrita na presença de pelo menos duas testemunhas, eis que conforme preceitua o art. 585, II, segunda parte, do CPC, o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas é título executivo extrajudicial. Nesse caso, havendo descumprimento dos termos acostados na ata de mediação, a parte descontente poderá acionar o Poder Judiciário, que não precisará do processo de conhecimento para mandar cumprir o que esteja pendente no acordo celebrado.

Por derradeiro, ressalte-se que o art. 5º, XXXV da Constituição Federal (CF/88) ordena que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Isso não significa que, sempre que houver controvérsia ou a iminência de uma controvérsia, a pessoa deva ingressar em juízo a fim de fazer valer seu interesse. A Constituição apenas garante o direito de acesso, não faz nenhuma imposição unilateral, muito pelo contrário, o próprio preâmbulo da Carta Maior enfatiza a busca de solução pacífica de controvérsias. Por isso são importantes a mediação e as demais formas alternativas de resolução de litígios, elas são uma alternativa ao Poder Judiciário, que muitas vezes se mostra moroso e inchado de demandas repetitivas e desgastantes. Por suposto, o inverso também é verdade, a busca de formas alternativas de resolução de controvérsias não impede que a parte prejudicada se valha do Estado-Juiz para tentar satisfazer sua pretensão, notadamente quando há descumprimento dos termos acordados, razão porque nada há de inconstitucional nos métodos alternativos de resolução de conflitos.

O Mediador


Decerto, o sucesso da mediação dependerá também do mediador, pessoa física neutra, responsável por conduzir a sessão de mediação da melhor forma possível. Ele deve buscar o diálogo entre as partes, mesmo que isso seja difícil, pois uma sessão de mediação satisfatória começa com o diálogo e o entendimento entre os demandantes. O mediador presidirá a sessão sem permitir ofensas, nem influências externas ao objeto da reunião, tampouco permitirá acordo contrário ao direito, aos bons costumes, à ética e ao interesse público. Deve o mediador atuar de modo imparcial, saber ouvir os problemas dos outros, ter capacidade de se ajustar a situações inesperadas, de ser flexível, dinâmico e paciente.

Christopher Moore (1998, p. 31), elucida brilhantemente a função do mediador ao informar que ele pode assumir vários papéis, com intuito de auxiliar as partes a resolverem a disputa, a saber:

O facilitador da comunicação, que inicia ou facilita a melhor comunicação quando as partes já estiverem conversando.
O legitimador, que ajuda todas as partes a reconhecerem o direito das outras de estarem envolvidas nas negociações.
O facilitador do processo, que propõe um procedimento e, em geral, preside formalmente a sessão de negociação
O treinador, que instrui os negociadores iniciantes, inexperientes ou despreparados no processo de barganha.
O ampliador de recursos, que proporciona assistência às partes e as vincula a especialistas e a recursos externos (por exemplo, advogados, especialistas técnicos, pessoas responsáveis pela tomada de decisão ou bens adicionais à negociação) que podem capacitá-los a aumentar as opções aceitáveis de acordo.
O explorador do problema, que permite que as pessoas em disputa examinem o problema a partir de várias perspectivas, ajuda nas definições das questões e dos interesses básicos e procura opções mutuamente satisfatórias.
O agente de realidade, que ajuda a elaboração de um acordo razoável, viável e que questiona e desafia as partes que têm objetivos radicais e não-realistas.
O bode expiatório, que pode assumir certa responsabilidade ou culpa por uma decisão impopular que as partes, apesar de tudo, estejam dispostas a aceitar. Isto lhes permite manterem sua integridade e, quando for o caso, obterem o apoio de seus constituintes.
O líder, que toma a iniciativa de prosseguir as negociações através de sugestões processuais ou fundamentais.

A capacitação do mediador conforme ensinamento de Jean-François Six deve ser constante, ele assevera que “a mediação é, com efeito, uma arte que não terminamos jamais de afinar, de aperfeiçoar; não a discernir, e tomá-la por uma aplicação de especialistas e de técnicos absolutos é enganar-se sobre ela”. (2001, p. 166).

Para se adquirir todas essas características de perfil do mediador, transcrevo a lição de Rodrigues Júnior, in verbis:

É necessário conciliar um aprendizado teórico e prático e desenvolvê-lo numa sólida instituição. Naturalmente que, além da capacitação teórica e prática, as características pessoais irão influenciar fortemente na formação do mediador. Assim, o seu tom de voz, a sua formação profissional anterior (psicólogo, advogado, assistente social,…), a sua religião, a sua condição social, servirão para definir o seu estilo próprio de mediação. Por isso cada mediador terá um estilo próprio e distinto dos demais. Por isso a importância de se definir os princípios da mediação, bem como um padrão ético de atuação. (RODRIGUES JÚNIOR, 2007, p. 114).

Lia Regina Castaldi Sampaio e Adolfo Braga Neto (2007) definem que o mediador detém um papel de liderança ante os mediados, devendo aquele dispor de empatia, isto é, capacidade para assimilar a condição das outras partes, colocando-se em seus respectivos lugares, de modo a tornar mais fácil a compreensão do problema vivenciado por ambas as partes, possibilitando o encontro de soluções mais eficientes.

Enquanto Christopher Moore define as várias facetas apresentadas pelo mediador, Sampaio e Braga Neto definem o que o mediador não é. Segundo esses autores (2007, p. 83-85), o mediador “não é juiz, nem árbitro; não é advogado; não é psicólogo; não é conselheiro; não é professor; não é assistente social; não é médico ou outro profissional da área de saúde; não é administrador” e, por fim, “não é engenheiro ou outro profissional da área de exatas”.

Sem necessidade de transcrever as palavras desses autores, é possível esclarecer o porquê do mediador não atuar como esses profissionais, a saber:

O mediador não é juiz porque não impõe decisão alguma; não é árbitro porque não existe prévia convenção entre as partes e, mais uma vez, não arbitra decisão alguma, não tendo o resultado da mediação força de título executivo. Conforme já estudado, o mediador apenas auxilia as partes a chegarem – elas mesmas – à solução da controvérsia.

Não é advogado porque não atua defendendo os interesses de uma das partes. Pelo contrário, é imparcial, neutro e não profere nenhum juízo de valor.

Não é psicólogo porque não atua explorando a emoção dos sujeitos, não se envolve em questões intersubjetivas das partes, como a relacional ou a comportamental. Pelo contrário, apenas identifica as questões basilares da controvérsia e encaminham as partes para que elas mesmas as percebam e busquem solucioná-las, pondo fim à querela.

Não é conselheiro, pois o conselho tem conteúdo extremamente subjetivo, pessoal, pobre de fundamentação e intimamente ligado à impressão preliminar limitada de quem aconselha, sem maiores conhecimentos sobre a questão. Assim, o mediador não é conselheiro, porquanto deve pautar o seu atuar pela melhor compreensão possível sobre a questão, de forma ética, prudente, sem subjetivismos e sem parcialidade.

Não é professor, haja vista que lhe cabe ensinar nada às partes. O mediador deve lembrar que seu atuar cinge-se exclusivamente pela condução das partes ao acordo, sem que para isso necessite inflamar-se de diálogos eruditos, improfícuos e que faça exaltação de si mesmo.

Do mesmo modo, o mediador não é assistente social, eis que não existe tutela dos mediados pelo mediador. A aparente condição de hipossuficiência de um dos mediados não traz para o mediador o dever de lhe prestar assistência no que tange a sua limitação. Pelo contrário, o mediador deve – mais uma vez – levar as partes para a melhor solução do litígio, pois o poder de decisão cabe a elas.

Também não é médico ou outro profissional de saúde, porque ele não vai “tratar” o conflito como se fosse uma doença passível de cura pela simples prescrição de uma receita. Pelo contrário, são as partes que devem buscar a “cura” do litígio, cabendo ao mediador o papel de explorador do problema, colocando em pauta as soluções possíveis para que as partes decidam.

Tampouco é administrador, posto que não dita regras preestabelecidas ou puramente sujeitas ao seu arbítrio. Pelo contrário, o mediador está no mesmo nível das partes, razão porque não lhe assiste impor regras ou decisões aos participantes da sessão de mediação.

Igualmente não é engenheiro ou outro profissional da área de exatas, uma vez que a mediação não é ciência exata, isto é, não possui uma fórmula específica para cada tipo de demanda distinta. Na mediação não se pode dizer que a o problema “x” ou “y” tem como solução “z”. Na mediação vige a espontaneidade, o informalismo e a ausência de regras preestabelecidas. Vale dizer, nem sempre a solução de algum caso servirá para outros, ainda que assemelhados.

Por fim, inegável é a afirmação de que o mediador, além de ter conhecimento acerca do direito material que se aplicará ao caso concreto, deverá possuir determinados conhecimentos específicos, isto é, habilidades pessoais relativamente a cada caso discutido. Não se concebe que o mediador atue, para solucionar o litígio, como se fosse advogado, juiz, psicólogo, engenheiro, médico, etc. Outrossim, nada impede que o profissional apto a exercer o papel de mediador exerça algumas dessas profissões. O que não vale é ele exercer sua função enquanto pendente a sessão de mediação, mas obviamente ele pode (leia-se como um poder-dever) usar de seus conhecimentos especializados, sem juízo de valor, para auxiliar as partes a chegarem ao acordo ideal.

A CONCILIAÇÃO

A conciliação é igualmente denominada negociação, advém do termo latino conciliare, que quer dizer “acerto de ânimos em choque”. É outro instituto bastante antigo.

Atualmente, a conciliação é definida como “processo pelo qual o conciliador tenta fazer que as partes evitem ou desistam da jurisdição”. (FIÚZA, 1995, p. 56).

Conforme bem elucida o Professor Rodrigo Almeida Magalhães:

O terceiro interventor (conciliador) atua como elo de ligação [sic]. Sua finalidade, (…), é levar as partes ao entendimento, através da identificação de problemas e possíveis soluções. Ele não precisa ser neutro [diferentemente do mediador], ou seja, pode interferir no mérito das questões. O conciliador não decide o conflito, ele pode apenas sugerir decisões; a decisão cabe às partes. (MAGALHÃES, 2008, p.28).

A conciliação poderá ser realizada dentro ou fora de um processo em curso, quando é realizada dentro do processo ela pode ser obrigatória ou facultativa, quando realizada fora do processo ela se dá devido à vontade das partes.

A conciliação encontra ampla aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro, por exemplo, no curso da audiência trabalhista, ela é obrigatoriamente proposta, nos termos dos art. 846 e 847 da CLT, após a apresentação da defesa por parte do reclamado. Consoante aduz o art. 850 da mesma Consolidação das Leis do Trabalho, a tentativa de conciliação é reiterada após a apresentação das razões finais.

A Lei nº. 9.958, de 12 de janeiro de 2000, diploma alterador da CLT, trouxe à baila a necessidade de ser realizada uma conciliação prévia de qualquer demanda de natureza trabalhista, se na localidade da prestação de serviços houver sido instituída a Comissão no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria (art. 625-D).

No âmbito processual civil, a conciliação é destaque por estar prevista entre os art. 447 a 449 do CPC. O parágrafo único do referido art. 447 dispõe que em causas relativas à família, terá lugar igualmente a conciliação, nos casos e para os fins em que a lei consente a transação. O art. 448 aduz que antes de iniciar a instrução, o juiz tentará conciliar as partes. Chegando a acordo, o juiz mandará tomá-lo por termo. Por fim, o art. 449 dispõe que o termo de conciliação, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, terá valor de sentença.

Por semelhante modo, o art. 125 do mesmo diploma processual civil estabelece que, dentre outros, ao juiz compete velar pela rápida solução do litígio e tentar a qualquer tempo conciliar as partes, inclusive em audiência preliminar (art. 125, II e IV e art. 331 do CPC).

Com efeito, com o advento da Lei nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995, a conciliação passou a ser regra em se tratando de infrações penais de menor potencial ofensivo e de demandas que não ultrapassem 40 (quarenta) salários mínimos.

O CNJ – Conselho Nacional de Justiça, ciente da importância do instituto da conciliação, criou o Dia Nacional da Conciliação, celebrado em todo país aos 08 (oito) de dezembro, data em que os tribunais e juízes participam de um verdadeiro mutirão pela conciliação. O CNJ, junto com os demais juízes e tribunais em todo Brasil, também mantém o projeto Semana Nacional da Conciliação, em que diversas controvérsias são rapidamente solucionadas, sem necessidade de processo judicial. O CNJ lançou ainda em 27/08/2010 o prêmio Conciliar é Legal, incentivando magistrados e tribunais a apresentarem práticas de conciliação individuais ou em grupos. Os prêmios incluem até mesmo menções honrosas.

O TJMG – Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais junto com a EJEF – Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes mantêm um amplo programa de conciliação, como a Semana da Conciliação e o recém criado 1º Congresso de Conciliação, lançado em 23/11/2010 com homenagens, premiações, palestras, mesas redondas, conferências, simpósios e atividades culturais, tudo com o escopo de conscientizar a população que conciliar é legal e importante para o desenvolvimento humano e social. Em sua primeira edição, o evento foi realizado no Minascentro, em Belo Horizonte.

Em 14 de fevereiro de 2003, a Corte Superior do TJMG publicou a Resolução nº. 407/2003, instaurando Centrais de Conciliação Cíveis em Varas de Família, cuja proposta de conciliação prévia, preferencialmente, dar-se-á nas causas relativas a pedido, oferta, exoneração e execução de alimentos; separação judicial, consensual ou litigiosa; divórcio, consensual ou litigioso e reconhecimento de união estável (art. 18, I a IV).

O conciliador responsável pela oitiva das partes em início de litígio será um estagiário, o qual dará oportunidade para que elas exponham suas razões, ouvindo-as atentamente e diligenciando para que se obtenha a conciliação (art. 20). Terminada a sessão e lavrado o termo de acordo, se houver, os autos serão conclusos ao Juiz-Orientador, para as providências legais cabíveis e, em seguida, devolvidos à Secretaria da Vara de origem, mediante carga (art. 21).

Por isso é que, nesse sentido, Pedro Lenza (2008, p. 638) estabelece a perspectiva de um novo tempo para o Judiciário brasileiro, ao aduzir, em síntese, que “’A reforma do Poder Judiciário’, as diversas alterações da legislação infraconstitucional e tantas outras que ainda estão por vir, (…), sinalizam uma luz na busca da esperada e ‘sonhada’ eficiência da prestação jurisdicional”.


A PROXIMIDADE ENTRE A MEDIAÇÃO E A CONCILIAÇÃO

Mediação e arbitragem não se confundem, naquela há a figura do mediador, que não tem poder decisório; nesta, há a figura do árbitro, que possui poder decisório.

No que tange às figuras da mediação e da conciliação, há um pouco mais de dificuldades em se estabelecer suas distinções, muitas pessoas inclusive pensam tratar-se de sinônimos. Por isso, faz-se necessária a observância das características inerentes a cada uma dessas figuras, a fim de se saber com precisão quando estaremos diante de uma situação de mediação ou de conciliação.

Lília Maia de Morais Sales elucida com exatidão a diferença entre esses dois institutos.

A diferença fundamental entre a mediação e a conciliação reside no conteúdo de cada instituto. Na conciliação, o objetivo é o acordo, ou seja, as partes, mesmo adversárias, devem chegar a um acordo para evitar um processo judicial. Na mediação as parte não devem ser entendidas como adversárias e o acordo é conseqüência da real comunicação entre as partes. Na conciliação, o mediador [conciliador] sugere, interfere, aconselha. Na medição, o mediador facilita a comunicação, sem induzir as partes ao acordo. (SALES, 2004, p.38).

Pelo exposto, verifica-se que na mediação, o mediador tem o dever de conduzir a discussão da maneira mais amena possível, evitando proferir opiniões próprias, mas guiando as partes para que elas mesmas alcancem a pacificação. O mediador deve ainda instruir as partes a chegarem ao acordo, mas sem palpitar no mérito da questão, orientando-as acerca das prováveis conseqüências de uma “aventura” judicial. Nessa modalidade de solução de controvérsias, as próprias partes decidem, o mediador é o guia, o qual não detém poder decisório. Ao contrário, na conciliação, há uma intervenção um tanto quanto mais objetiva do conciliador, ele pode, por exemplo, sugerir um “meio termo”, proferir opiniões, sugestões, etc. É claro, o conciliador (assim como o mediador) devem atentar-se para as questões de ordem pública em toda a sua atuação, não permitindo acordos contrários ao bom costume, à ética e ao direito.

Para finalizar a distinção entre os referidos institutos, transcrevo os ensinamentos de Roberto Portugal Bacellar, o qual afirma:

A conciliação é opção mais adequada para resolver situações circunstanciais, como indenização por acidente de veículo, em que as pessoas não se conhecem (o único vínculo é o objeto do incidente), e, solucionada a controvérsia, lavra-se o acordo entre as partes, que não mais vão manter qualquer outro relacionamento; já a mediação afigura-se recomendável para situações de múltiplos vínculos, sejam eles familiares, de amizade, de vizinhança, decorrentes de relações comerciais, trabalhistas, entre outros. Como a mediação procura preservar as relações, o processo mediacional bem conduzido permite a manutenção dos demais vínculos, que continuam a se desenvolver com naturalidade durante a discussão da causa. (BACELLAR, 2003, p. 231).

Assim, conclui-se que a mediação e conciliação não são institutos usados indiscriminadamente, um como se fosse o outro. Dependendo da situação, uma dessas modalidades pode ser mais adequada do que a outra.

A ARBITRAGEM

Diversamente do que ocorre na mediação, em que um terceiro imparcial e dotado de neutralidade assiste às partes a fim de que elas mesmas possam alcançar a pacificação, o acordo; bem como, diversamente da conciliação, em que o conciliador, também imparcial, integrante ou não do Poder Judiciário, tem liberdade para verdadeiramente aconselhar e/ou induzir as partes ao acordo, não apenas abrindo caminho para elas mesmas decidirem a demanda; na arbitragem, concede-se a um terceiro igualmente neutro, o poder de emitir decisões quanto às controvérsias levadas pelas partes, que devem eleger o árbitro de comum acordo, ou, não havendo acordo, o juiz pode indicar o árbitro.

Verifica-se, portanto, que o árbitro emite decisões, não se tratando apenas de conduzir as partes a um acordo. O árbitro atua com poder decisório relativamente ao mérito da demanda. É claro que, desejando, no curso do procedimento arbitral, as partes podem celebrar um acordo, submetendo-o à homologação do árbitro. Nesse ínterim, a lei da arbitragem (Lei nº. 9.307/96) preconiza em seu art. 31 que a sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.

O pacto celebrado entre as partes, antes da instauração do procedimento arbitral, constitui uma espécie de contrato entre elas. Mais do que isso, as partes elegem o árbitro, celebrando com este um novo contrato. Tal pacto chama-se convenção arbitral, dela advém a cláusula compromissória e o compromisso arbitral, que serão objeto de estudo mais à frente.

Sem dúvida, em relação à natureza jurídica da arbitragem, não se pode olvidar que o árbitro exerce verdadeira jurisdição, paralelamente à força estatal, fazendo-o com amparo da lei e da convenção celebrada.

Nesse sentido, o eminente José Cretella Neto (2009, p. 15) salienta que “a doutrina vê na arbitragem instituto misto, sui generis, pois abriga aspecto contratual e também jurisdicional, que coexistem, posição defendida por Pierre Lalive e Philippe Fouchard”.

Havendo compromisso firmado entre as partes, não pode haver descumprimento de suas cláusulas, sob pena de violação do consagrado princípio do “pacta sunt servanda”, segundo o qual o contrato é lei entre as partes.

Consoante aduz Carlos Alberto Carmona (1998, p. 258) “a equiparação entre a sentença estatal e a arbitral faz com que a segunda produza os mesmos efeitos da primeira”.

Arbitragem e arbitramento

Há aparente similaridade entre os conceitos de arbitragem e arbitramento, razão porque se deve saber distingui-los. Ambos não se confundem. Aquele que exerce a arbitragem é o árbitro, ele tem poder decisório e por força de lei sua decisão é dotada de caráter executório. Aquele que exerce o arbitramento é arbitrador, ele é um experto, um perito, geralmente contrato pelas partes ou nomeado pelo magistrado, após fixação de seus honorários, para formação de um laudo pericial que servirá de meio de prova no procedimento em curso.

Pedro Batista Martins elucida mais ainda a distinção entre os referidos termos:

Inobstante derivarem do latim arbiter (juiz, louvado, jurado), no vocábulo jurídico, as palavras arbitragem e arbitramento contêm significados diferentes, muito embora tenham sido utilizadas como sinônimas em nosso texto constitucional de 1946 (art. 4º), bem como em outras normas legais e, com certa freqüência, em obras jurídicas de caráter doutrinário.

Enquanto a primeira pressupõe a determinação ou estimação de um valor, a segunda corresponde à solução pacífica de um litígio entre sujeitos de direito interno ou internacional. (MARTINS, 1990, p. 1).

Conceito de arbitragem

Superada a questão da proximidade entre a arbitragem e arbitramento, resta-nos tentar conceituar a arbitragem.
A Lei nº. 9.307/96 não define o que é arbitragem, tarefa que cabe precipuamente à doutrina.
Para Carmona, arbitragem é:

Meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia de sentença judicial. (CARMONA, 1998, p. 43).

Irineu Strenger conceitua a arbitragem como:

Sistema de solução de pendências, desde pequenos litígios pessoais até grandes controvérsias empresariais ou estatais, em todos os planos do Direito, que expressamente não estejam excluídos pela legislação. (STRENGER, 1996, p. 33).

É fácil perceber que, baseado nesses conceitos, a arbitragem depende da existência de controvérsia que verse sobre direitos disponíveis. O art. 25 da lei de arbitragem versa que sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral remeterá as partes à autoridade competente do Poder Judiciário, suspendendo o procedimento arbitral.

Mas não é só disso, a arbitragem também depende da indicação do árbitro (ou árbitros, geralmente em número ímpar) pelos próprios litigantes (ou pelo juiz). Igualmente, devem ser observadas as normas previamente estabelecidas na convenção arbitral.

Por fim, decisão do árbitro chamada sentença arbitral possui eficácia de título executivo judicial (art. 475-N, IV, do CPC), podendo ser executada sem a necessidade de um processo de conhecimento.

O ÁRBITRO

É de particular importância a eleição do(s) árbitro(s), visto que é ele a figura que conduzirá o procedimento arbitral e proferirá uma sentença, a qual as partes, por pacto, submeter-se-ão.

O art. 13, § 1º da lei brasileira de arbitragem diz que as partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes. Se as partes elegerem um número par de árbitros caberá a esses árbitros eleitos elegerem o de número ímpar, sendo que, em caso de desacordo, as partes requererão a nomeação do novo árbitro ao juiz a quem tocaria originariamente conhecer da causa (art. 13, § 2º).

Qualificação do árbitro

O árbitro não precisa ter uma qualificação profissional específica, mas deve trajar-se de ética, zelo e probidade, ciente de que atua como verdadeiro pacificador social. Nesse sentido, o art. 14 § 1º da lei de arbitragem institui o chamado “dever de revelação”, que é o dever que o árbitro eleito tem, antes da aceitação da função, de revelar qualquer fato que denote dúvida justificada quanto a sua imparcialidade e independência.

Impedimento e suspeição do árbitro

Os casos de impedimento e suspeição previstos nos artigos 134 a 138 do Código de Processo Civil são extensíveis aos árbitros por força do caput do art. 14 da referida lei nacional de arbitragem.

No procedimento arbitral, cabe à parte interessada argüir, na primeira oportunidade que tiver para falar nos autos, após a instituição da arbitragem, questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem (art. 20). Caso contrário, conforme ensina Rodrigo Almeida Magalhães (2008, p. 81) as partes “não mais poderão discutir tais questões no curso da arbitragem, mas somente através de ação anulatória no Poder Judiciário”. Salienta-se que o julgamento da questão relativa à competência, suspeição e impedimento caberá ao próprio árbitro.

Quem pode ser árbitro

De acordo com os ensinamentos do Professor César Fiúza (1995, p. 120), pode-se considerar árbitro “toda pessoa natural que, sem estar investida da judicatura pública, é eleita por duas ou mais pessoas para solucionar conflito entre elas surgido, prolatando decisão de mérito”.

A posição de Fiúza não é pacificada, alguns doutrinadores, a exemplo de Scavone Junior (2008, p.102), defendem a possibilidade de uma pessoa jurídica ser árbitro, desde que esteja representada.

A maioria, porém, defende a posição de Fiúza, salientando-se que as partes ao invés de elegerem elas mesmas os árbitros, podem atribuir essa função à câmara arbitral, que elegerá os árbitros dentre os que compõem o seu quadro próprio.

Poderes do árbitro

O árbitro é considerado o juiz de fato e de direito, sendo que sua sentença não ficará adstrita a recurso ou homologação pelo Poder Judiciário (art. 18 da lei de arbitragem).

Por tudo isso, a ele compete presidir a função e fazer valer sua autoridade, com poderes, dentre outros, para oitiva de partes e testemunhas, solicitar a produção de provas, inclusive a pericial e solicitar a execução de medidas cautelares ao Judiciário, eis que o árbitro não detém poder para mandar cumprir essas medidas.

Inclusive, no que tange aos efeitos da legislação penal, os árbitros equiparam-se aos funcionários públicos (art. 17), podendo incorrer nas condutas tipificadas no Código Penal Brasileiro, notadamente nos art. 316 (Concussão), 317 (Corrupção Passiva), 319 (prevaricação) e outros; bem como ser vítima de crimes como desacato (art. 331 do CPB).

Salienta-se, por derradeiro, que serão sempre respeitados no procedimento arbitral (art. 21 § 2º) os princípios institutos do processo, como o contraditório, bem como a igualdade das partes, a imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.

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