quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Questões de Concurso - Comentários e Resposta

Eficácia da Lei no Tempo - Questão Resolvida 




Letra “A" - Por meio da revogação, em sentido amplo, termo afeto ao processo legislativo, a norma é extinta do sistema jurídico por outro ato normativo da mesma espécie, o que não se aplica às normas declaradas inconstitucionais.

Uma norma de mesma espécie pode revogar outra norma, bem como uma norma de hierarquia superior também pode revogar uma norma de hierarquia inferior.

Quando a norma é declarada inconstitucional, ela perde sua eficácia, sua força obrigatória é retirada e não vigora mais. A norma inconstitucional é inválida (pois perde seu fundamento que é a Constituição Federal). Não ocorre a revogação da norma inconstitucional, pois sendo nula, tal norma nunca ingressou no ordenamento jurídico.

Incorreta letra “A".

Letra “B" - A irretroatividade é a regra geral em matéria de direito intertemporal, não se admitindo, em hipótese alguma, a retroatividade de atos normativos em observância à segurança jurídica.
LINDB:
Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada
A irretroatividade é a regra e a retroatividade exceção. A norma pode retroagir, desde que venha expresso em seu texto e não atinja o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Incorreta letra “B".

Letra “C" - A promulgação da lei a torna obrigatória para a coletividade.
Promulgação – quando a lei nova é introduzida no ordenamento jurídico, sendo reconhecida a sua existência e validade.
Publicação – serve para dar conhecimento a todos da existência da lei.
A lei se torna obrigatória para toda a coletividade após entrar em vigor. Após ser publicada, se em seu texto nada houver, passados 45 (quarenta e cinco) dias da sua publicação, a vigência da lei se inicia (se torna obrigatória para a coletividade). Porém, se vier expresso outro prazo ou que a lei entrará em vigor naquela data, a partir daí, então, se tornará obrigatória para todos.
Incorreta letra “C".

Letra “E" - A vigência da lei coincide necessariamente com a data de sua publicação no Diário Oficial

Assim dispõe o art. 1º da LINDB:

Art. 1o  Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.

A vigência da lei começa 45 (quarenta e cinco) dias após oficialmente publicada (a publicação da lei se dá no Diário Oficial). 

Pode coincidir a vigência com a data da sua publicação no Diário Oficial, se vier expresso em seu texto. Se não vier expresso, aguarda-se 45 (quarenta e cinco) dias e só então se inicia a vigência da nova lei. 

Incorreta letra “E".

Acertou quem Respondeu a Letra D ! Comentário:

Letra “D" - Pode ser promulgada nova lei sobre o mesmo assunto de norma já promulgada, sem que se ab-rogue tacitamente a anterior. 
A revogação da lei pode ser:

Parcial – quando a lei nova revoga apenas parte da lei anterior. É chamada de derrogação. 

Total – quando a lei nova revoga todo o texto da lei anterior. É chamada de ab-rogação. 
E assim dispõe o §2º, do art. 2º da LINDB:
§ 2o  A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
Ou seja, pode ser promulgada nova lei sobre o mesmo assunto de norma já promulgada, sem que se ab-rogue (revogação total) tacitamente (não vem expresso em seu texto) a lei anterior.
Correta letra “D". Gabarito da questão.

Neyse Fonseca, Professora de Direito Civil. (QConcursos.com)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Questões de Concurso - Eficácia da Lei no Tempo



Em relação à eficácia da lei no tempo, assinale a opção correta:


 a) Por meio da revogação, em sentido amplo, termo afeto ao processo legislativo, a norma é extinta do sistema jurídico por outro ato normativo da mesma espécie, o que não se aplica às normas declaradas inconstitucionais.

 b) A irretroatividade é a regra geral em matéria de direito intertemporal, não se admitindo, em hipótese alguma, a retroatividade de atos normativos em observância à segurança jurídica.

 c) A promulgação da lei a torna obrigatória para a coletividade.

 d) Pode ser promulgada nova lei sobre o mesmo assunto de norma já promulgada, sem que se ab-rogue tacitamente a anterior.

 e) A vigência da lei coincide necessariamente com a data de sua publicação no Diário Oficial.


Confira amanhã no iDIREITO a resposta Comentada !

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Vagas e Estágios

18 de fevereiro de 2016.

Estágio - Setor Jurídico

Atividades: Acompanhamento de processos, juntada de documentos, protocolar documentos, fórum, audiências.

Remuneração: a combinar

Benefícios: Seguro de vida , Plano de saúde, vale transporte e vale refeição.

Local de trabalho: Imbiribeira.

Os interessados deverão enviar currículos com o título da vaga para o e-mail: rh.imbiribeira@gmail.com

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Advogado Corporativo Trabalhista


Com 5 anos de OAB, inglês intermediário e pós graduação em direito do trabalho ou direito administrativo. Precisa realmente ter expertise sólida com trabalhista, conhecimento especialisado nesta área.

Interessados deverão enviar e-mail com o titulo da vaga no assunto para lucilene.silva0@walmart.com

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Estágio - Departamento De Registro (Jurídico)

Necessário certo conhecimento da área de constituição, alteração e baixa empresarial junto a JUCEPE, Receita Federal, SEFAZ, Prefeitura e demais. 

Ter domínio do pacote office, boa redação e ser dinâmico. 

Cursando superior em Contabilidade ou Direito. 

Ter estagiado em empresa de contabilidade será um diferencial. 

Os interessados deverão enviar currículos com o título da vaga para o e-mail: recrutamento.registro@embraccon.com.br

Você conhece a Teoria dos frutos da árvore envenenada?



Repudiada pelo Direito as provas ilícitas ou obtida por meios ilegais são expressamente vedadas pela Constituição Federal de 1988. Por ser derivada do direito norte-americano a Teoria da Árvore dos Frutos Envenenados afirma que uma prova ilícita originária ou inicial teria o condão de contaminar as demais provas decorrentes, ou seja o processo que contém prova obtida por meio ilícito é nulo e todos os atos decorrentes, também, devem ser tidos como nulos, é o que a doutrina denomina prova ilícita por derivação. Por outro lado, a prova ilícita pode ser usada em situações excepcionais ou quando o direito tutelado é mais importante do que aquele atingido, isto pelo princípio da proporcionalidade e também, pelo princípio do estado de inocência, quando permite o uso da prova ilícita pro reo.

No processo penal, a teoria dos frutos da árvore envenenada - fruits of the poisonous tree - propugna que provas lícitas oriundas de meios ilícitos não poderão ser aceitas, vez que contaminadas.

Portanto, em razão um vício na origem, de ilicitude, serão ilícitas as demais provas que delas se originarem. Eis o corolário da teoria aplicada no art. 573, § 1º, do CPP. Assim ensina Fernando Capez:

É o caso da confissão extorquida mediante tortura, que venha a fornecer informações corretas a respeito do lugar onde se encontra o produto do crime, propiciando a sua regular apreensão. Esta última prova, a despeito de ser regular, estaria contaminada pelo vício na origem. Outro exemplo seria o da interceptação telefônica clandestina — crime punido com pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa (art. 10 da Lei n. 9.296/96) — por intermédio da qual o órgão policial descobre uma testemunha do fato que, em depoimento regularmente prestado, incrimina o acusado. Nesse diapasão, tal teoria, de cunho da Suprema Corte norte-americana (United States Supreme Court, 1920), tem sido aplicada na ordem normativa brasileira (STF – HC 93.050 – Rel. Min. Celso de Mello – DJe 1º­-8­-2008 e STJ – HC 191.378 – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 5­-12­-2011).

A advinda do direito norte americano a “fruits of poisonous tree” tem em seu nascimento um preceito bíblico de que a árvore envenenada não pode dar bons frutos, ou seja a prova ilícita originária ou inicial contaminaria as demais provas decorrentes. Porém, esta teoria não é absoluta sob a ótica do Direito Americano havendo limitações a sua aplicação.

É o que Paulo Ivan da Silva afirma :

Com vista a dar efetividade a essas finalidades (principalmente a 1ª e a 2ª), a Suprema Corte Americana desenvolveu a teoria dos frutos da árvore envenenada (the fruits of the poisonous tree), segundo a qual a árvore ruim (busca ilegal, p. ex.) dará maus frutos: processo e condenação injustos e, consequentemente, nulos. Por outras palavras: independentemente da legalidade da colheita, a prova também será ilícita se derivar de outra prova ilícita. Depois disso, em cortes mais conservadoras, a Suprema Corte estabeleceu diversas limitações a essa teoria, dentre elas estas duas: a) limitação da fonte independente, segundo a qual os fatos descobertos a partir da prova ilícita não seriam necessariamente ilegais, se pudessem ainda ser provados por fonte independente; b) limitação da descoberta inevitável, pela qual a prova seria admissível se a acusação provasse que ela seria inevitavelmente descoberta por meios legais, etc.

Por outro lado, no Brasil a teoria dos frutos da árvore envenenada só se aplica às provas decorrentes, ou também como são conhecidas “por derivação” da prova ilegal, não se aplicando a provas sem relação com a contaminação.

O Supremo Tribunal Federal acolheu a teoria dos frutos envenenados julgando o seguinte:

Prova ilícita: escuta telefônica mediante autorização judicial: afirmação pela maioria da exigência de lei, até agora não editada, para que, ‘nas hipóteses e na forma’ por ela estabelecidas, possa o juiz, nos termos do art. 5º, XII, da Constituição, autorizar a interceptação de comunicação telefônica para fins de investigação criminal; não obstante, indeferimento inicial do habeas corpus pela soma dos votos, no total de seis, que, ou recusaram a tese da contaminação das provas decorrentes da escuta telefônica, indevidamente autorizada, ou entenderam ser impossível, na via processual do habeas corpus, verificar a existência de provas livres da contaminação e suficientes a sustentar a condenação questionada; nulidade da primeira decisão, dada a participação decisiva, no julgamento, de Ministro impedido (MS nº 21.750, 24/11/93, Velloso); consequente renovação do julgamento, no qual se deferiu a ordem pela prevalência dos cinco votos vencidos no anterior, no sentido de que a ilicitude da interceptação telefônica – à falta de lei que, nos termos constitucionais, venha a discipliná-la e viabilizá-la – contaminou, no caso, as demais provas, todas oriundas, direta ou indiretamente, das informações obtidas na escuta (fruits of the poisonous tree), nas quais se fundou a condenação do paciente.(STF, HC 69.912-RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 155/508).

Por outro lado, há os que defendem a tese de que a prova obtida por meios ilícitos, não poderá ser retirada dos autos, a não ser no caso de a própria lei assim o ordenar.

Fontes:
Acesso em http://www.perguntedireito.com.br/239/o-que-e-a-teoria-dos-frutos-da-arvore-envenenada

Santos, Paulo Ivan da Silva. As provas obtidas com violação da intimidade e sua utilização no Processo Penal. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2110. Acesso em: 25/07/07

Acesso em: http://www.abdir.com.br/doutrina/ver.asp?art_id=1362&categoria=Penal


O Assédio Moral e a Legislação Brasileira

O Assédio Moral e a Legislação Brasileira


Tema de grande relevância e amplamente discutido nos Tribunais pelo país é o assédio moral. Ele nada mais é do que qualquer conduta praticada reiter
adamente pelo empregador ou por empregado em face de subordinado ou colega de trabalho, com o intuito de atacar a dignidade do trabalhador ou seus direitos, sua higidez física ou mental. É também qualquer outro ato capaz de comprometer sua carreira profissional ou que degrade o ambiente de trabalho.

Trazendo para o plano concreto, estas condutas são aquelas frequentemente observadas em grande parte das empresas como, por exemplo, a humilhação constante de colega de trabalho.

O tema é tão relevante que a Organização Internacional do Trabalho realizou estudos na União Européia e concluiu que pelo menos 9% dos trabalhadores do mencionado bloco sofrem com tratamento tirânico de seus patrões.

Ocorre que até o presente momento o tema assédio moral não foi regulamentado pela legislação brasileira. Apesar de não impedir a condenação judicial de quem o pratica, tal fato é bastante prejudicial, eis que não existem critérios definidos sobre sua caracterização e, sobretudo, a respeito de suas conseqüências. Na prática a doutrina vem se encarregando desta tarefa estabelecendo seu conceito, sendo a reparação pecuniária garantida pelo Poder Judiciário.

Diversos projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sem que se chegue à necessária regulamentação em âmbito federal.

Entretanto, em 16 de junho de 2009 a Medida Provisória n. 453/08 foi convertida na Lei n. 11.948/09, que versa sobre a constituição de fonte adicional de recursos para ampliação de limites operacionais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e dá outras providências. Dentre estas, nota-se a disposição contida no seu art. 4º, que veda “a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelo BNDES a empresas da iniciativa privada cujos dirigentes sejam condenados por assédio moral ou sexual, racismo, trabalho infantil, trabalho escravo ou crime contra o meio ambiente”.

Apesar da citada Lei não se referir propriamente ao assédio moral, em uma primeira análise parece louvável a restrição prevista para os casos de condenação de dirigentes de empresas privadas por assédio moral.

Entretanto, vislumbra-se problema na referida previsão legal. A regra prevê a restrição ou vedação de empréstimo financeiro concedido pelo BNDES nos casos em que os dirigentes de empresas privadas forem condenados por assédio moral. Ocorre que no âmbito trabalhista este fato raramente ou nunca se concretiza, pois o empregado vítima do assédio moral aciona somente a empresa junto ao Poder Judiciário, pois ela é responsável pelos atos de seus empregados e dirigentes. Assim, a reparação pecuniária decorrente da comprovação da ocorrência do assédio moral recai somente sobre empresa, isto é, somente ela é condenada judicialmente.

Cria-se neste ponto a primeira controvérsia: não sendo o dirigente condenado pelo citado assédio, mas a empresa da qual faz parte, pode-se aplicar a vedação ou restrição constante no art. 4º, isto é, pode-se restringir ou vedar os empréstimos concedidos pelo BNDES?

Outro problema que surge é que na esfera penal não há previsão legal do crime de assédio moral, razão pela qual não haverá a condenação criminal de qualquer empregado ou dirigente, o que pode inviabilizar a aplicação da mencionada restrição ou vedação.

Assim, foi aberto amplo campo para controvérsias acerca da previsão contida no art. 4º, da Lei n. 11.948/09, que provavelmente assolarão ainda mais o Poder Judiciário e gerarão entendimentos diversos nos Tribunais do país.

Deve-se ressaltar que é louvável a atitude do legislador nacional em criar mecanismos para punir empresas que são coniventes com o assédio moral em seu ambiente de trabalho. Entretanto, a medida adotada deveria ter observado melhor rigor técnico como, por exemplo, constar no referido art. 4º que a vedação ou restrição se aplicaria também em caso de condenação da empresa por assédio moral.

No entanto, o que todos esperam é a criação de legislação nacional própria para o assédio moral, a fim de que seja mais facilmente coibido nos ambientes laborativos.

Fonte: Blog Juriscorrespondente

O que faz um Juiz Federal ?

Leandro Cadenas Prado é Juiz Federal Substituto. Aprovado em 1º lugar, exerce suas atribuições na 3ª Vara Federal Criminal de Foz do Iguaçu/PR.





O que faz um Juiz Federal?

Nas palavras da Constituição Federal, o juiz é um órgão do Judiciário. Assim, ele é um agente de Estado, responsável por dizer o Direito de forma definitiva. Especificamente no caso da Justiça Federal, ao juiz cabe julgar as ações em que a União, suas autarquias e empresas públicas federais são, de alguma forma, interessadas. Além disso, julga também outras matérias, como aquelas envolvendo Estados estrangeiros, a disputa sobre direitos indígenas, as causas referentes à nacionalidade e à naturalização e a execução de sentença estrangeira.
Em matéria penal, entre outros, julga os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, os crimes contra a organização do trabalho e, regra geral, os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves. 

O senhor poderia explicar para o concurseiro a diferença entre um Juiz Federal e um Juiz de Direito? As provas para estes concursos são diferentes?

A organização judiciária brasileira divide a Justiça em alguns órgãos. Assim, a Constituição separou o Judiciário em dois grandes grupos, um formado pela Justiça especializada (trabalhista, militar e eleitoral), e outro pela Justiça comum (federal e estadual). As competências da Justiça especializada e da Justiça comum federal estão previstas na própria Constituição. Tudo o que não for de competência de um desses quatro órgãos é direcionado à Justiça comum estadual. Nesse ramo do Judiciário atua o Juiz de Direito. Assim, a diferença básica entre ambos é que este está vinculado a um Tribunal de Justiça, estadual, e tem competência distinta do Juiz Federal, vinculado a um dos cinco Tribunais Regionais Federais.
Cada tribunal, seja de Justiça, seja Federal, faz o seu próprio concurso.
Há diferença entre as provas para juiz estadual e juiz federal, tendo em vista as diversas matérias que são exigidas em cada um deles, em razão das competências serem também diferentes. Assim, por exemplo, Direito Eleitoral é cobrado no certame para o primeiro cargo, e não para o segundo. De outro lado, Direito Internacional, Econômico e Financeiro são cobrados para o segundo, e não para o outro.

Quais os principais desafios? Há diferença do exercício da profissão em cada Tribunal? 

O desafio é enorme, já que, como se pode imaginar, decidir o destino das pessoas não é uma tarefa simples. Deve-se julgar sempre com imparcialidade, à luz do Direito, reconhecendo quem tem razão na demanda.
As pressões existem de todos os lados. É fácil observar que, em uma decisão judicial, sempre uma das partes vai ficar insatisfeita. Por vezes, ambas!
Mas, com humildade, dedicação e responsabilidade, faz-se um bom trabalho, que impacta a sociedade, e é essa a grande beleza da magistratura!
Não há grandes diferenças de trabalho entre os diversos Tribunais. O juiz, uma vez aprovado no concurso de um Tribunal, ficará a ele vinculado, salvo raras exceções, como é o caso de permuta ou remoção para outro.
Por exemplo, o Tribunal Regional federal da 4a Região, ao qual estou ligado, engloba os três Estados do Sul: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Então, posso trabalhar em qualquer Vara Federal de qualquer desses Estados.

Como é o dia a dia deste profissional?

A atividade diária do juiz inclui o andamento do processo, proferindo despachos, decisões, sentenças. É bastante comum a realização de audiências, nas quais ouve as partes, testemunhas, peritos etc.
Além disso, também deve estar à disposição para ouvir, mesmo fora das audiências previamente marcadas, qualquer pessoa interessada em algum dos processos sob sua responsabilidade, como advogados, autores e réus. 

Esta profissão pode ser estressante? Por quê?
Sim, esse é um grande problema da magistratura, reconhecido nacionalmente.
O volume de trabalho é elevado, e a pressão pela qual passa o profissional é constante. A todo momento se depara com a necessidade de decisões urgentes, problemas jurídicos inéditos, cobranças da sociedade.
Contudo, como já citado, com responsabilidade é possível fazer um bom trabalho, sem o estresse que caracteriza essa e tantas outras profissões.

O senhor considera a prova para passar neste concurso difícil? Quanto tempo o senhor estudou até passar?

No mundo "concursal" costuma-se colocar o concurso para a magistratura, ao lado da carreira do Ministério Público, como um dos mais difíceis do país.
Não é simples, nem fácil, mas perfeitamente possível ser aprovado. São quase duas dezenas de matérias para estudar e várias fases para superar!
Eu estudei, para esse concurso, aproximadamente quatro anos, dos quais dois inteiramente dedicados a ele, já que pedi licença sem remuneração do meu cargo anterior para tanto.
Como se percebe, o volume de informações é muito grande, o que gera uma necessidade também grande de tempo dedicado a isso. Essa é uma das razões pelas quais é um concurso no qual costumam sobrar vagas, ou seja, os aprovados sequer são suficientes para suprir as vagas abertas.
Estudar muito e por muito tempo exige abnegação, dedicação, perseverança. Mas, como se vê, é perfeitamente possível.
Depois de tanto estudar, reprovar em uma série de concursos, e ir, paulatinamente, melhorando de desempenho a cada nova prova, consegui chegar lá, sendo aprovado em primeiro lugar em ambos os concursos: juiz federal e juiz de Direito. E isso com uma única atitude: estudar com vontade e dedicação. Estudar muito, com afinco e sem esmorecer ao me deparar com as inúmeras barreiras que tive.

Qual é para o senhor o maior obstáculo para os concurseiros que querem passar neste certame?

Costumo dizer que a maior dificuldade é manter-se motivado pelo tempo necessário para absorver todo o conteúdo exigido para alcançar a aprovação.
Pela minha experiência com quase duas décadas de vivência "concursal", seja como candidato, seja como professor, autor ou palestrante, pude perceber que não é propriamente a matéria da prova que mais traz problemas para o candidato, mas sim o tempo em que ele precisa se dedicar para aprender tudo o que vai ser cobrado no certame.
Fomos acostumados, durante nossa vida estudantil, a nos preocuparmos apenas com a próxima prova, que, via de regra, envolvia tão somente a matéria aprendida no último bimestre. O concurso muda esse paradigma. Temos que estudar o conteúdo de, talvez, cinco anos de faculdade para responder perguntas de uma prova em um único dia. E isso gera problemas para a maioria dos alunos, muitos dos quais acabam por desistir no meio do caminho.
E é nesse ponto que me parece que a motivação é fator primordial. Saber estudar, de uma forma ou de outra, todo mundo sabe. Contudo, manter-se motivado por muito tempo, para estudar para uma prova que, muitas vezes, sequer sabemos quando será aplicada, é tarefa que requer atenção redobrada.
Assim, deve cada um buscar algo que o motive a seguir estudando. Os momentos de desânimo certamente aparecerão, cedo ou tarde, e por repetidas vezes. Nessas horas o candidato deve lembrar-se daquilo que o levou a estudar, a querer esse cargo, a se dedicar ao concurso. E, ânimo redobrado, retomar os estudos, até passar! 

Há alguma disciplina que se precisa estudar mais?

Sim, aquela que o candidato menos gosta. Essa ele deve estudar mais, com mais vontade, com mais atenção, com mais afinco. É natural que deixemos de lado o que não nos agrada, mas, agindo assim, será justamente ela que vai tirar o candidato do páreo.
Por outro lado, estudando mais a matéria que menos gostamos percebemos uma situação interessante, pela qual eu mesmo passei: aprendendo a matéria, passamos a gostar dela e, de inimiga, passa a ser uma grande fonte de preciosos pontos para a prova!

Qual mensagem o senhor daria aos concurseiros que estão estudando para passar em um concurso?

Faça uma avaliação sincera do que você quer. Se é passar em um concurso, anime-se, prepare-se para a jornada (que será certamente difícil, longa, mas recompensadora!), e não desista enquanto não passar.
Como já falei, encontre alguma coisa para se motivar nos momentos de fraqueza e vá até o final. 
A vitória é garantida!
Sucesso sempre!



Entrevista concedida para a Editora IMPETUS.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Aborto: exemplo clássico de uma constitucionalização simbólica¹.


Em tempos em que engravidar ou abandonar uma gravidez é um dos temas principais de discussão pelo atual momento que a nossa saúde pública vivencia com a associação do vírus da zika adquirido pela mãe ao nascimento de bebês com microcefalia, nada mais propício do que evidenciarmos o modelo constitucional que o nosso país acaba adotando.  

Vamos entender primeiramente o contexto jurídico que o termo enquadra, quando, nas palavras de Marcelo Neves, em trabalho apresentado para a obtenção do cargo de Professor Titular da Universidade Federal de Pernambuco em 1992, a legislação simbólica do nosso país “...aponta para o predomínio, ou mesmo hipertrofia, no que se refere ao sistema jurídico, da função simbólica da atividade legiferante e do seu produto, a lei, sobretudo em detrimento da função jurídico-instrumental”.

Mas vamos entender do que se trata: Entende-se por “simbólico” algo puramente representativo, quem tem o caráter de um “símbolo”. No contexto em que o assunto será tratado, iremos abordar a função puramente “simbólica” de textos constitucionais carentes de concretização normativo-jurídica.  Neves determinou ambiguidade entre “símbolo”, “simbólico” e “simbolismo”. O autor propõe três fatores que caracterizam os tipos da legislação simbólica, e são eles: a) confirmar valores sociais, b) demonstrar a capacidade de ação do Estado e c) adiar a solução de conflitos através de compromissos dilatórios.

Com a intenção de confirmar valores sociais, Neves defende nesta tipologia que o legislador assumiria uma posição em relação a determinados conflitos sociais e, ao consagrar este posicionamento, dar-se-ia a “vitória legislativa” para o grupo que tem a sua posição amparada na lei, tornando-se superior a concepção valorativa, e considerada secundária a verdadeira eficácia normativa da lei.

Ainda seguindo a lógica de classificação dos tipos de acordo com Neves, esta mesma legislação simbólica teria o intuito de assegurar confiança nos sistemas jurídico e político. A resposta à sociedade em forma de legislação teria como objetivo amenizar insatisfações ocasionadas por determinado conflito, aparentando uma possível solução para aquele problema, de forma a mascarar a realidade. Neves ainda reforça que “Neste sentido, pode-se até afirmar que a legislação-álibi constitui uma forma de manipulação ou de ilusão que imuniza o sistema político contra outras alternativas, desempenhando uma função ‘ideológica’”.²

Por último, o autor cita o adiamento da solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios, que neste caso, considerada como uma consequência relacionada a questão anterior. Prevendo a ineficácia da lei e transferindo a solução do conflito para um futuro indeterminado, resta a população e sociedade apenas a ampliação da ilusão que imuniza o sistema político citado anteriormente.

O Código Penal Brasileiro considera o aborto como um crime contra a vida nos seguintes casos: a) aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (Pena de detenção de um a três anos); b) aborto provocado por terceiro, sem consentimento da gestante (Pena de reclusão de três a dez anos); c) provocar aborto com o consentimento da gestante (Pena de reclusão de um a quatro anos). As exceções serão nos casos em que o aborto for praticado por médicos nas seguintes situações: a) a gravidez for resultante de estupro e a gestação for até a 20ª semana; b) se o feto for anencéfalo – em decisão do STF em 2012; c) se o feto apresentar risco de vida à mãe (neste caso pode ser feito em qualquer ponto da gravidez). Segundo juristas, os casos de fetos com microcefalia não se encaixam na mesma exceção daqueles com anencefalia porque a microcefalia não é incompatível com a vida.

Recentemente alguns posicionamentos do médico mais popular do Brasil, conhecido por quadros na televisão, vídeos em redes sociais e best-sellers como Estação Carandiru, o Dr. Dráuzio Varella, trouxeram à tona um dos exemplos relacionados a esta associação. Em defesa de que o aborto já é livre no Brasil, e que só é ter dinheiro para fazer em condições razoáveis (e que tudo diferente desta realidade fé falsidade e hipocrisia), coloca em evidência a concepção valorativa que a legislação sobre o aborto do nosso país foi legislada. O médico afirma ainda em entrevista que "a mulher rica faz normalmente (o aborto) e nunca acontece nada. Já viu alguma ser presa por isso? Agora, a mulher pobre, a mulher da favela, essa engrossa estatísticas. Essa morre”.³ Ainda fazendo relação ao poder das massas e da posição valorativa de grupos, o médico defende de que não considera correto que a maioria possa impor sua vontade sem respeitar a opinião das minorias, desrespeitando a democracia.

Dentro do contexto epidêmico cheio de incertezas vivenciado, a microcefalia vem sendo diagnosticada em média na 28ª semana de gravidez, com margem de erro de cinco semanas. De acordo com a Folha de São Paulo4, algumas grávidas brasileiras estão recorrendo ao aborto ilegal ao primeiro sinal de infecção pelo vírus da zika, mesmo sem confirmação se o feto tem ou não microcefalia. Três médicos relataram a Folha casos de mulheres que já tinham tomado esta decisão, sendo as mesmas casadas, com educação de nível superior, boas condições financeiras e que tinham planejado a gravidez e que, com o desespero da possibilidade da criança nascer com má formação, optaram pelo aborto. As gestações estavam entre a 6ª e 8ª semana de gravidez e foram interrompidas com o misoprostol (Citotec). O medicamento é obtido no mercado ilegal com disponibilização apenas a hospitais. Sua venda é proibida nas farmácias desde 1988.

Com foco na garantia de direito de escolha das mulheres e na saúde das mesmas, a antropóloga Débora Diniz do instituto de bioética Anis, atualmente faz parte de um grupo que prepara uma ação similar para pedir ao Supremo Tribunal Federal a legalização do aborto em gestações com bebês com microcefalia. Ela debate que a responsabilidade do Estado em garantir a erradicação do mosquito não aconteceu, e o responsabiliza. Trata também que, constitucionalmente, as mulheres não poderão ser “penalizadas pelas consequências de políticas públicas falhas”5, entre outras iniciativas.

O documento que está sendo preparado deve argumentar que a ilegalidade do aborto e a falta de políticas de erradicação do Aedes ferem a Constituição Federal em dois pontos: direito à saúde e direito à seguridade social. A argumentação deve ainda destacar a vulnerabilidade específica de mulheres pobres – já que a epidemia ainda se concentra em áreas carentes do país, especialmente no Nordeste.

"É preciso garantir a todas as mulheres, e não só às que têm acesso a serviços de saúde ou podem pagar um aborto ilegal", diz Débora à BBC Brasil. "Autorizar o aborto não é levar as mulheres a fazê-lo. Quem tem dinheiro e quer já faz. Justamente quem tem mais necessidade não pode ser privado do direito de escolher sobre a própria vida"5, afirma.

E durante essa discussão, ainda temos um ponto relevante a considerar:

Toda esta problemática enfatiza não só o modelo ultrapassado de nossa legislação simbólica voltada para o aborto envolvido por várias questões culturais e políticas, assim como enfatiza a necessidade de termos um olhar mais fiel e confiável numa constituição que de fato, amplie a cidadania, elabore mais leis concretas e que o judiciário tenha mais ações que apoiem a implementação de efetividade das normas constitucionais vigentes, dando a sociedade algo que faça sentido, superando seu caráter puramente retórico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

¹ O referido tema da “Constitucionalização Simbólica” foi exigido, dentre outros, no edital do IV Concurso para ingresso na Carreira de Defensor Público do Estado de São Paulo (2010). A apresentação se dará de acordo com o trabalho: Marcelo Neves, A constitucionalização simbólica, Col. Justiça e Direito, passim. O tema também foi objeto do programa “Aula Magna” da TV Justiça e pode ser assistido em: http://www.youtube.com/watch?v=15V5uTLfi2c (“A Constitucionalização Simbólica Revisitada”).

² Marcelo Neves, op. cit., p. 40

³ Entrevista Drauzio Varella a BBC Brasil acessada em http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/02/160201_drauzio_aborto_rs na data de 02/02/2016 às 16:57

4 Reportagem na Folha de São Paulo acessada em http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/01/1735560-gravidas-com-zika-fazem-aborto-sem-confirmacao-de-microcefalia.shtml na data de 02/02/2016 às 16:34

5 Reportagem de Ricardo Senra, sobre o grupo prepara ação no STF por aborto em casos de microcefalia em notícia na BBC Brasil, acessada em http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160126_zika_stf_pai_rs na data de 03/02/2016 às 10:25h

Código Penal Brasileiro

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Queiroz Cavalcanti - Vaga para Advogado


Escolas do Crime

"Prisões são um desastre para segurança pública", afirma Maria Laura Canineu

Na quarta-feira 27, a Human Rights Watch (HRW) divulgou seu relatório anual sobre a situação dos direitos humanos no mundo e, apesar de constatar alguns avanços no caso brasileiro, condenou a situação catastrófica da segurança pública e do sistema prisional.

A retomada dos trabalhos do Congresso em fevereiro, o mais conservador desde a ditadura, trará à tona novamente a discussão de pautas que envolvem direitos humanos e o sistema penitenciário, como a redução da maioridade penal e a revogação do Estatuto do Desarmamento. Para Maria Laura Canineu, diretora do escritório Brasil da organização, o debate no Brasil sobre o tema de direitos precisa evoluir e a sociedade perceber que as prisões não são muito mais do que escolas do crime. 




CartaCapital: Mesmo com as notícias sobre as condições precárias em presídios, a população e o Congresso continuam a incentivar a redução da maioridade penal, que mais pessoas sejam presas. De onde vem este impulso?

Maria Laura Canineu: A sociedade tem este impulso porque construiu alguns mitos em relação à maioridade penal. É preciso quebrá-los. Em primeiro lugar, os defensores da proposta afirmam que reduzir a maioridade penal diminuirá a criminalidade. Contudo, é provável que esta medida aumente ainda mais a criminalidade.

Nos Estados Unidos, onde há pelo menos 30 anos adolescentes acima de 16 anos vêm sendo tratados como adultos na esfera criminal, estudos apontam que essa prática não serviu para reduzir o crime: pelo contrário, é mais provável que adolescentes julgados como adultos reincidam na conduta criminosa e passem a cometer crimes mais graves em comparação com aqueles que são mantidos nos centros de detenção juvenis.

Os defensores da proposta também dizem que a simples ameaça de ser julgado como adulto fará com que os adolescentes fiquem com medo de cometer crimes e que dessa forma, a criminalidade caia. No entanto não há nenhuma evidência disso. Estudos psicológicos demostram que os adolescentes têm uma perspectiva de mais curto prazo que os adultos e atuam mais por impulso.

Por fim, os defensores da proposta dizem que os adolescentes que cometem crimes desfrutam de plena impunidade no Brasil, o que não é verdade. Eles são julgados e podem ser obrigados cumprir medidas socioeducativas.

A partir dos 12 anos, adolescentes já são processados e julgados pelas varas de infância e juventude e encaminhados para os estabelecimentos socioeducativos se condenados em até três anos por atos infracionais graves.

CC: O presidente norte-americano, Barack Obama, recentemente proibiu jovens de ficar em solitárias e reduziu o tempo máximo para adultos. Que elementos faltam em nossa sociedade para que esse debate também possa ser feito aqui?

MLC: Nos Estados Unidos, que é o país com o maior número de presos do mundo, está ocorrendo uma enorme mudança. Políticos de ambos os partidos e até delegados de polícia hoje concordam que o encarceramento em massa não aumenta a segurança pública. Também existe um reconhecimento crescente dos prejuízos de manter penas excessivamente duras.

No Brasil, o número de presos aumentou quase sete vezes nos últimos 25 anos, alcançando mais de 600 mil pessoas, que são mantidas em instalações com vagas para 377 mil. Esse crescimento explosivo levou o sistema prisional à beira do colapso, tornando as cadeias focos de violência, doenças e corrupção e de graves violações dos direitos humanos.
Trancafiar suspeitos de crimes não violentos juntamente com condenados por homicídio e membros de facções criminosas, como acontece atualmente no Brasil, equivale a enviar novatos à escola do crime. As prisões do Brasil não são só um desastre de direitos humanos, mas também um desastre enquanto política de segurança pública. É preciso que esse tema seja tratado com prioridade por todos os agentes públicos responsáveis pelo assunto prisional.

CC: Um governo supostamente progressista está no poder há mais de uma década e o encarceramento em massa foi aprofundado neste período. A HRW tem alguma opinião sobre o que pode acontecer caso um governo mais conservador assuma o poder? 

MLC: As graves violações de direitos humanos no sistema carcerário brasileiro são um problema crônico; nem governos de esquerda nem de direita mostraram vontade política de realizar a profunda reforma que é necessária.


Os direitos humanos não são uma questão de partido político. Políticas que se baseiam no respeito aos direitos humanos são necessárias não só como reconhecimento da dignidade de todo ser humano, mas também porque levam a políticas de segurança pública muito mais efetivas e eficientes.

CC: Para a HRW a privatização do sistema penitenciário é algo que pode melhorar a situação das prisões brasileiras? 

MLC: O trabalho da HRW é o de documentar as piores violações de direitos humanos e fazer recomendações para que se dê um fim nos abusos. No sistema penitenciário brasileiro temos documentado graves violações relacionadas com a superlotação, a violência, a falta de controle dos presídios por parte do estado, e situações de graves crimes cometidos dentro do sistema prisional como estupros coletivos.

No Maranhão, a segurança do complexo penitenciário de Pedrinhas estava praticamente em mãos privadas no governo anterior e o resultado foi muito negativo. Os terceirizados não recebiam treinamento adequado para trabalhar em um presídio, tinham salários muito abaixo do que os agentes penitenciários do estado, além de condições de trabalho precárias. Essa falta de treinamento colocava em risco a segurança deles e dos próprios detentos. O governo atual está tentando reverter essa situação.

Em Pernambuco existe uma “privatização” perversa, uma vez que o controle dos pavilhões dentro dos presídios está nas mãos de alguns presos, chamados “chaveiros”, e não do próprio Estado.

Além disso, a privatização de presídios introduz na gestão empresas cujos interesses econômicos são que o Brasil mantenha os maiores níveis possíveis de encarceramento. Nesse contexto, qualquer reforma para promover medidas alternativas à prisão é mais difícil.

Para nós, o melhor modelo de gestão prisional é aquele que garanta a vida, a dignidade, a integridade física, a segurança e a saúde do preso.

CC: O Estatuto do Desarmamento vai voltar para a pauta do Congresso em breve. Como a HRW enxerga alterações neste Estatuto?

MLC: Os governos têm a responsabilidade de proteger os cidadãos de ações de outras pessoas que ameaçam direitos básicos, como o direito à vida e o direito à segurança, segundo o direito internacional. A violência facilitada pela disponibilidade de armas é uma ameaça para esses direitos fundamentais.

O Comitê de Direitos Humanos da ONU tem pedido aos países membros “proteger a sua população contra os riscos pela disponibilidade excessiva de armas de fogo”. As propostas no Brasil para debilitar o Estatuto do Desarmamento vão na contramão dessa recomendação.

No Brasil tem um estudo do economista Daniel Ricardo de Castro Cerqueira que demostra que a aplicação do Estatuto do Desarmamento levou à diminuição nos crimes violentos, em particular nos homicídios, no estado de São Paulo entre 2001 e 2007. O título do estudo é representativo: “Menos armas, menos crimes”.

Fonte: Ingrid Matuoka - Carta Capital